domingo, 28 de dezembro de 2008

Envelope fechado

Eu devia ter feito um texto em papel e letra escrita manualmente com as previsões do que aspirava para os meus dias neste dois mil e oito. Assim que os escritos estivessem sob a forma de parágrafos, colocá-los-ia num envelope e fecharia com a condição de só podê-lo abrir hoje, 28 de dezembro deste ano ainda corrente. No entanto, eu não posso afirmar com garantia nenhuma se teria indicado tudo que me ocorrera até a presente data. Não mesmo.

O fato é que esta carta confessional - com alto teor visionário - nunca existira nem tão pouco foi planejada. Mas me deixem considerar que esse texto exista, pois parte do que será descrito em seguida poderia muito bem ter sido narrada nesta carta. Ainda bem que não foi. Haja tanta previsibilidade nos dias de hoje, fugir da obviedade me foi mais um adorável luxo inesperado.

Ainda bem.

Então, eu tinha um TCC pra fazer. Catso! Esperar quatro anos por esse tal trabalho que me seria menção para terminar a academia e concretizar planos futuros me pegou de jeito. Me fez trocar noites etílicas e desajuizadas por calmaria e tensão em frente a um computador por horas. Muito café, pouca badalação. Muita gastrite, nada de álcool. Eu bem que podia ter ficado louca, sem exagero algum.

A melhor parte já se faz conhecida: a faculdade foi uma das épocas mais felizes da minha existência, e me deu muito mais do que o esperado. O mais provencial foi me tornar madura o suficiente pra reconhecer que ainda preciso do apoio de muitos, mas a minha parte eu tenho feito de modo inteiro. Nada de metades - isso faz parte de textos antigos.

Ponto.

Por ora, vale ressaltar que, quando a alforria do projeto me permitia um fim de semana ou outro - que seja lá, sair em plena quarta-feira-delícia - parecia que a vida noturna continuava a mesma. Os queridos, os abraços, os beijos, a música, os clubes - essa mesmice me soou ridícula por algumas vezes, muito mais porque eu estava mais comprometida em idealizar outras situações (...) A diferença nesse contexto noturno se dava exclusivamente pelo número de copos consumidos, um tanto quanto maior que o de costume; porém releve, caro, eu merecia esse tipo de atento.

Além dos copos, os corpos. Aquela mania, lembra? Exatamente. A de se apaixonar sem medida alguma. Pois bem. Continua e, ao que tudo indica, é carma. E a Talita jurou de pés juntos que aceita esse fardo - aliás, escrever há mais de 2 anos seja [entre colchetes] ou não é um indício ligeiramente concreto de que o assunto preferido dela é esse. Não há muito o que fazer, convenhamos. Ou há - e ela sabe que sim.

Eu corri pra casa, tantas vezes. Escrevi menos do que quis, e não por falta de vontade. Acho que foi mais por estagnação, talvez. Contudo, os textos que pretendo escrever, estes sim, estão em envelopes fechados. Esperando por qualquer intuição semiótica.

No mais, este ano deve acabar. Afinal toda história tem o seu término. Só assim o autor se preocupa em promover um desfecho válido de se ansiar para um novo texto. É o ciclo das coisas. A parte isso eu tenho história pra contar para os meus netos, e um punhado de folhas em branco previamente prontas para qualquer coisa.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Cortem a cabeça dela!

Paradoxal se torna pouco quando o fluxo de sentimentalidades num mesmo dia consegue me deixar com um riso intimamente feliz, a ponto de fazer o cara da locadora de DVD's ter a maior inveja do mundo. Os olhos chegam a demonstrar isso; e quando a felicidade alheia é refletida na pupila, meu bem, é melhor se entregar.

17:31

A tarde corre em passo lento, como numa procissão sem volta. Esse novembro parece durar uns três meses, 90 dias ao invés de 30. O que me dá a clara impressão de que o tempo estacionou e resolveu me colocar numa sala de espera, tal qual nesses consultórios dentários: você marcou uma consulta, anunciam o teu nome, mas tudo indica que te deixar lá esperando é um prazer tão irritantemente tenro quanto devorar uma torta de limão.

[Enquanto o coro de 'In Between Days' grita]

18:47

A minha pressa não tem causa nem motivo pra quem vê a cena. O que eu até entendo. De fora do palco, a cortina é mais bonita quando erguida; ainda mais se for um drama, comédias não são bem assistidas numa quinta-feira.

19:38

Eu tomo uma coca-cola e respondo que não. Eu faço um convite e deixo o indicativo de aceitabilidade notável. Eu resolvo ir embora.

21:07

Estou insuportavelmente chata, sem vontade de atender o celular pra quem quer que seja. Estou insuportavelmente cativante e distribuindo uma série de abraços à minuto pra quem quer que eu queira. Estou insuportavelmente exausta.

01:46

Ansiedade.

02:00

Exatidão inerte, divida tudo isso entre as 24 horas corriqueiras de um dia qualquer e não terá uma noção da freqüência. Nem eu tenho e não me culpo por isso.

sábado, 15 de novembro de 2008

Coliseo

'Eu tenho um amor. Desses que não cabem no peito e se abrigam em toda e qualquer parte do corpo. Não me sai da cabeça, faz as pernas correrem rápido quando chama, toma nas mãos o acalento que assegura, rouba um lábio de cá e um sorriso entralaçado em doçura de lá, faz vibrar o peito, um frio na barriga [desses que não se pode controlar]. É triste admitir, mas eu sei que existe uma impressão clara nisso tudo, e esse é o ponto: admitir e ter certeza é crucial e doloroso quando há correspondência. E se há, que não seja dor. Pois antes a dúvida em forma de corpo do que o contentar-se acreditado e fulgaz de sentir por perto.'

+++

Escrito em 2007 - e guardado por motivos que ainda desconheço -, mas fazendo um sentido imenso exatamente agora.

[Smashing Pumpkins atesta]

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Minha melhor possibilidade:

Downloading.
Updownloading.

domingo, 21 de setembro de 2008

A última e a primeira

Imagino que quando se começa com Mutantes, boa coisa deve ser. De fato, a teoria procede. Comigo, sim. Mas é bem verdade que esse tipo de situação tem uma variabilidade significativa de pessoa para pessoa.

Nos conhecíamos há um tempo razóavel. A ponto de sabermos os gostos um do outro, as viagens que cada um tinha feito, a razão das nossas tatuagens, os piercings que perdemos pelas causas mais idiotas do mundo, o time do coração [em comum, por sinal], e outras peculiaridades que nos tornaram um tanto quanto próximos.

Após uma série de convites tendenciosos - do tipo 'traz uma garrafa de vinho e ficamos por aqui', 'você tá em São Paulo?', 'um amigo vai dar uma festa, vamos?' - e vários desencontros, aconteceu que em um sábado qualquer o nosso plano de ter um encontro só nosso vingou.

Fui recebida com um abraço tão pertinente, que o perfume dele parecia ter reconhecido o meu. Aquele abraço foi uma espécie de troca. A nossa conversa era fácil e parecia se dar entre dois velhos conhecidos. Já conseguia identificar o que F. queria só de observar o movimento dos seus pés.

- Vou colocar um som pra gente. Sugestão?
- Confio no teu bom gosto, guri.
- Certo. Tu gosta de No Doubt?
- Principalmente as mais antigas.

F. aproveitou para explicar o conceito visual da capa de 'Tragic Kingdom' - designer, sabe como é? -, e me deixava ainda mais encantada. Ele me atraía fisicamente; e, admito, isso foi a razão propulsora que me instigou a visitá-lo. Entretanto, F. era daqueles que sabiam inteligentemente o que falar. Conversamos sobre história, filosofia, charutos cubanos e revoluções marginais.

No entanto, não demorou muito e deixamos todos os assuntos prováveis para uma outra hora. Em uma fração imperceptível, as roupas dele fariam companhia as minhas [que estavam jogadas ao lado do sofá].

A playlist seguiu. Dormimos ao som de Johnny Cash. Acordamos com Tarantino, Sin City.

+++

A última foi num silêncio total. Nenhuma trilha sonora de fundo, nada. A não ser o barulho do que parecia ser uma chuva. Também era sábado, tal qual na primeira, só que de manhã.

Conseqüência de uma sexta-feira que parecia não ter acabado. Pelo contrário, ainda tinha uma garrafa de vodka na casa dele. Aliás, eu tinha deixado essa garrafa lá uns dias antes; não desconfiava que ela seria lembrada novamente.

Amigos a parte, interesses em comum e a vontade de saber se existia alguma reciprocidade. E existia. O silêncio deu espaço ao movimento sútil de R. ao abrir os botões da minha blusa. Ao passo que os lábios se conheciam milimetricamente, o restante cumpria a seqüencia de nos fazer esquecer tudo o que acontecia do lado de fora da porta.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Chacun a son gout

Gosto de palavras tattuadas. Mas confesso que não sabia que uma das minhas também servira de motivo para uma ópera.

Bizarro!

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Aqui, Ali, Em Qualquer Lugar


Vem cá meu bem
Me descola um carinho
Eu sou neném
Só sossego com beijinho
E vê se me dá o prazer
De ter prazer comigo


O duo RR - Rita Lee e Roberto Carvalho - sabe das coisas.
Cantando Lenon e McCartney, mais ainda.

A gente faz amor
Por telepatia
No chão, no mar, na lua
Na melodia

Alguém discorda?

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Do you know

what it feels like for a girl?

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Cama

Isso tem a ver com carma.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Carma

Eu ia escrever um post sobre carma - post esse, que deveria ter aparecido por aqui no último domingo por razões de sincronicidade que eu ainda não entendo. Não sou afetuosa à matemática, mas em tais condições tenho de concordar com o fato de que 'a ordem dos fatores não altera o produto'. Em outras palavras, tanto faz se esse post resolveu dar as caras hoje ou ontem.

Domingo passado, 3 de agosto, perguntaram-me se eu preferia amor à dinheiro. Sinceramente, era mais fácil participar de escolhas que envolviam sorvete de flocos ou pistache, balinhas de goma vermelhas ou roxas, all star de cano alto ou de cano baixo, scarpin ou salto alto, anyway. Libriana convicta - leia-se indecisa -, adivinha qual foi a minha resposta?

Carma, foda-se.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Apaixonada

Eufemismo para o título: você arruinou a minha vida.

Ok. Admito que me encontro nesse estado vulnerável - por ora, o coração é vulnerável. Mas ressalvo que estou sob níveis britânicos seguros de dopamina. Robbie Williams for all the eternity. Obrigada, meu Deus.

sábado, 26 de julho de 2008

Questão de sorte

Inebriante.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Ela tem um piercing, e ninguém mais sabe

'Mais uma daquelas situações que acontecem sem a gente perceber e que, um belo dia, se repetem com uma qualidade de detalhes incontestável'

Segunda-feira.

O que te faz acordar logo pela manhã também te faz ter a vontade de não levantar da cama. Essa lógica pode ser tão banal quanto a teoria da relatividade mas tem uma beleza infindável.

A garota deveria estar de pé ás 9 e pouco, quase 10. A mãe marcara médico para ela, cardiologista, por acreditar que a filha tem uma vida deveras agitada, cheia de estudos e trabalhos adoráveis. Devido à rotina da filha - que tem início sexta-feira pela noite com o 'mãe-tô-saindo-não-tenho-hora-prá-voltar' -, a mentora viu necessidade em marcar-lhe uma consulta naquele que cuida de todas as mazelas do coração. Não dessas dores que são doídas de amor ou paixonites, falo sério: problemas cardíacos podem nos tirar a vida.

Antes da seção 'deixe-me ouvir o que o teu peito esconde', a jovem fora convidada a fazer um eletrocardiograma:

- Moça, final do corredor. Aguarde e te chamarão pelo nome.

- Uhum, fiz que sim com a cabeça.

O telefone do laboratório toca. A atendente fala algumas bobagens em protótipo de código para o outro alguém na linha. Admito estar curiosa em saber do que falam, mas me perco olhando as gotas de chuvas que teimam em cair pelo lado de fora. Na esquerda, o rapaz de branco me observa de lado - eu sei que sim, e não é por falsa modéstia - enquanto finge apertar uns botões, como se mandasse uma informação de extrema relevância por via de um fax cinza, meio escuro, meio novo.

Três minutos depois [ou um pouco menos], aquele de branco me chama pelo primeiro nome. Sigo alguns poucos passos e estou dentro de uma sala. Ele pede cordialmente que eu tire tudo o que fosse metálico, inclusive óculos e uma correntinha; além do casaco que visto - apesar de este não conter nada de metal. Também pede que eu abra o meu sutiã. Não faço recusa. Tudo muito profissional, tal qual esses exames devem ser.

Ao deitar, ele me pergunta se costumo visitar o consultório com freqüência. Digo que não, graças que não sofro nenhum mal aparente do coração. Após o breve diálogo, um gelado é colocado em meus pulsos e tornozelos. Trata-se de um tipo de gel que possibilitará o contato entre o equipamento para medição e os meus batimentos. Faceiramente, o guri levanta a minha blusa. 'Calma, sem alardes', pensei. Mais gel na região do colo. 'Não tem segredo, menina', mentalizo comigo, 'É só um exame'. Ao tempo que pronuncio em suspiro a última vogal da palavra 'exame', percebo que o moço tirara que o meu sutiã recém aberto. Os seios ficam a mostra. 'Mais calma, pequena. Mais calma', penso novamente em tom de mantra, 'É só um exame inocente, não há o que temer'. Descaradamente, ele mantém os olhos fixos como se estivessem enjaulados em alguma cápsula temporal.

Silêncio, um pouco.

- E (...) Doeu pra furar?
- Nadinha.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Seven Days.

I've got a feeling. It's automatic.
I've got a feeling. It's automatic.
I've got a feeling. It's automatic.
I've got a feeling. It's automatic.
I've got a feeling. It's automatic.
I've got a feeling. It's automatic.

Zoot Woman explica.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

O Código Winehouse

Cada centímetro do topete retrô-espetacular da cabeleira de Amy Winehouse simboliza a sua insegurança - isso, de acordo com a própria. Então vamos combinar que insegurança tem sido uma palavra latente na existência da cantora.

Contudo, há quem diga que Amy não passa de uma junkie. Dessas que não tem absolutamente nada mais útil para fazer em London City, e que, por isso, prefere se embriagar de vodka e doces lágrimas de amor - além de outros vícios.

Cocaína? Aham. A moça usa e abusa do pó branco. Crack? Também. Inclusive com vídeo à la vida loca life-style para mostrar que a britânica, com voz de negra, é uma viciada. Uma addicted!

Once is enough to make me attack
So bring me a bag and your man can come back
I'll check him at the door make sure he got green
I'm tighter than airport security teams

De fato, a única droga que a consome em doses crônicas é um mal que todas as pessoas carregam no peito. A diferença é que algumas mostram e se agarram onde dói, enquanto outras vivem no anonimato do sofrimento. E é exatamente assim que dois grupos distintos se evidenciam: o de pessoas e o de pseudo-pessoas.

Over futile odds
And laughed at by the gods
And now the final frame
Love is a losing game

Sem perceber, Amy se descreve em suas letras. Um refrão e o Código Winehouse é decifrado.

I cheated myself
Like I knew I would
I told you I was troubled
You know that I'm no good

E refrão após refrão - em uma seqüência tão viciante quanto os vícios da nossa querida - os ouvidos se concentram em espasmos criteriosamente segmentados por camadas: sensação, frases soltas, Frank Sinatra, vinho e cia limitada.

Por fim as músicas atingem a profundidade do pulmão, e o receptor se vê irremediavelmente sem fôlego e respirando o mesmo ar que Miss Winehouse. Afinal, uma vez ouvida, a moçoila vai invadir a sua concentração e o teu lábio involuntariamente vai cantarolar um They tried to make me go to rehab but I said 'no, no, no' como se essa composição tivesse sido feita pelo teu próprio pulso.

sábado, 21 de junho de 2008

Kitsune

Eu não gosto de esperar. Nunca gostei. A única manifestação que tenho próxima ao ato de esperar é o fato de não esperar. Exatamente assim.

Esperar cansa e desgasta um bocado. Esperar é não ter certeza de nada, mas principalmente não querer ter certeza de nada. Afinal, quando alguém espera por alguma coisa - no âmago dessa espera - existe a impossibilidade ineficiente de não saber a causa nem prováveis conseqüências dessa espera toda.

Esperar é impotência e fragilidade.

domingo, 15 de junho de 2008

Pistache

Ao ver os seus pés caminhando em uma fração de segundos que eu adoraria poder controlar, me vieram de tino o senso e o total entendimento do quão satisfeita estava por ter esperado a seqüência de tempo que esperei.

O fato é que esse 'total entendimento' me trouxe uma série de dúvidas e inquietudes. Dúvidas por conta de que estas aparecem sempre que penso em alguma constância referente à necessidade de planejar - vulgo idealizar -, que nada me agrada, ao contrário: significa uma doce tortura. Inquietudes conseguem me deixar em um estado confortavelmente desconfortável; ao passo que me traz um riso pela existência tua, também me traz uma falta de senso um tanto quanto oblíqua, obrigando-me a fazer coisas que eu não pensava que faria.

Tantas outras vezes me senti declinada à escrever diretamente à tantas pessoas, mesmo que não lessem absolutamente nada; a vontade de escrever era minha - e só.

Agora, torna-se tão rigorosamente excitante perceber emoções que desperdicei para, em troca, nos termos tão próximos.

Mas o sabor do sentir 'verdadeiro' é tão mais desconhecido; e não chega nem a ser um sabor, nós é que deslumbramos uma imaginativa sede intangível de querer saber o gosto de tudo. E, justamente, o que é verdadeiro não tem sabor, cheiro nem cor alguma. Somente nos apetece com a sua adorável indelicadeza de nos deixar a mercê de um poder que nos deixa fraco, e supostamente sossegados em uma tênue linha curvativa amorosa e viciante.

+++

Ressalva: disseram-me que a eternidade um dia será tragada pelo acaso. Ainda não tenho juízo a respeito de tal tese.

domingo, 8 de junho de 2008

Eco

Degraus
Cinza
Amarras
Cinza
Neblina
Nuvem
Bandeira
Notas musicais
Timidez solar
Lua
Recorte
Violeta
Punhos cerrados
Veludo
Selos
Timbres
Olhos de ressaca
Degraus

Uma lista de palavras que fazem sentido; ou não.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Sexta-feira.

Ela sempre tinha uma carta na manga. E sempre escondia detalhes quando não havia necessidade de escondê-los. Ela tinha o costume de não idealizar contos de fada, até que um dia viu a sua própria estória contada nas cenas de um filme. Ela não conseguia entender que podia ser alguma coisa além de ser 'coisa' pra alguém, mas certa vez guardaram-a num potinho com um laço bonito e bem forte.

Ela nunca quis esse laço. No entanto, a verdade é que ela nunca pensou que fosse possível caber em algum laço. Laços soavam tão subjetivos, tão próximos ao irreal, ao itocável e de todas as outras impossibilidades cabíveis.

Ela raramente atendia quando a chamavam ou correspondia signos alheios. Ela gostava do silêncio, de deixar as palavras correrem solitárias: uma em busca da outra. Admirava a forma, o conteúdo e o contexto.

Ela tinha medo de sonhar e mais medo ainda de que esses sonhos todos fizessem arte na vida dela. Ela via graça em acordar na hora errada, e de fingir sono só pra ganhar um beijo no pescoço. Ela preferia dormir abraçada, eternamente.

Mas ela ainda acredita em noites de sexta-feira.

domingo, 1 de junho de 2008

Anexos.

Digo que penso em muita coisa ultimamente. Talvez por pensar nessas coisas todas, acabo por não chegar em conclusão nenhuma. Nada. Por via das dúvidas, acho que é melhor parar de pensar.

É.

sábado, 24 de maio de 2008

Nota de rodapé:

Paris is burning!

Trilha sonora da vez. Bom momento para fechar lacunas e portas que antes estavam abertas na espera de uma chave-mestra (...) Digamos que as janelas estão deixando o sol entrar. Obrigada.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

C.F.A.

- Acho que sou bastante forte para sair de todas as situações em que entrei, embora tenha sido suficientemente fraca para entrar.
- Acho espantoso viver, acumular memórias, afetos.

Silêncio.

- Não, meu bem, não adianta bancar a distante: lá vem o amor nos dilacerar de novo.
- (...) você não sabe como tentei me interessar pelo desinteressantíssimo.

Nostalgia.

- A gente se apertou um contra o outro. A gente queria ficar apertado assim porque nos completávamos desse jeito, o corpo de um sendo a metade perdida do corpo do outro.
- O tempo que temos, se estamos atentos, será sempre exato.

Constatação.

- Quem diria que viver ia dar nisso?
- Loucura, eu penso, é sempre um extremo de lucidez. Um limite insuportável.
+++

Diálogos recortados criteriosamente pelos escritos de Caio Fernando Abreu. Todos.

Porque quando nos falta senso de apetite em segmentar sentimentos, é viável usar recursos de quem sabe o que fazer com as palavras.

Blue.

Under your skin
Under your truth
Under some words
Under the sky
Under your eyes
Under your tight hug
Under my imagination
Under our dream
Under our kind of reality
Under all those things.

sábado, 17 de maio de 2008

Like a virgin

Touched for the very first time
Like a virgin
When your heart beats (after first time, "With your heartbeat")
Next to mine

A 'virgem' preferida de sempre, vulgo matriz do pop oitentista, está de volta. She's Madonna! Material Girl, esposa de Guy Ritchie, mãe de Lourdes Maria e Rocco, escritora, atriz, cineasta, ex-bateirista, dona de um número invejável de recordes na discografia mundial (não necessariamente nessa ordem), Madonna Louise Veronica Ciccone Ritchie foi responsável por lançar um dos meus últimos cds preferidos. Me refiro ao Confessions On a Dance Floor. Não digo tanto pelo aspecto musical da coisa, uma vez que não sou especialista nisso. Palpito enquanto ouvinte. Me limito a dizer que a referência setentista, com remixes pertinentes e balzaquianos, além das letras diretas e mais 'cabalísticas', me atraíram com evidência.

Remember remember and never forget
All of your life has all been a test
You will find the gate that's open
Even though your spirit's broken


Confessions me seguiu por um bom tempo. Sempre rola uma nostalgia bacana quando lembro tudo que aconteceu durante esse período, aliás. E eu fiquei demasiadamente empolgada com a idéia da vinda da turnê desse show para o país do carnaval; vai saber se a Madonna não curte um samba, ponto pra gente. Mas não foi bem assim.

Do you believe in love at first sight?
It's an illusion, I don't care
Do you believe I can make you feel better?
Too much confusion, come on over here


O novo mito (?) da vez propaga que desse ano não passa. Juro que não quero criar expectativas infundadas, idealização não é comigo - não mesmo. Entretanto, é fato que me dá uma pontinha de querer vê-la ao vivo. E Hardy Candy nem é o grande motivo para tanto, embora as músicas estejam nos meus ouvidos desde o lançamento do cd; algumas bem antes (thanks world wide web). Porém, isso não quer dizer que estamos falando de uma obra prima. A Madonna já produziu umas coisas muito mais significativas, para não dizer outra coisa. No entanto, de todo mal não está. Dá pra ir além dos '4 minutos'.

Who is the master?
Who is the slave?

Ressalva: uma tangência martelou a minha cabeça de modo incessante, me fazendo considerar que Britney Spears queria muito fazer um cd nos moldes de Hardy Candy . Primeiro porque ela ia aparecer na mídia com uma manchete deveras vitoriosa do tipo 'O fantástico regresso da musa teenager-pop-americana-rebolativa. Outro, Brit ia ter o Timbaland como produtor; meio que uma certeza imediata de aparecer bastante. E o mais importante de todos, a Britney ia ser 'obrigada' a gravar com o Justin - o seu Eternal Sunshine Of The Spotless Love (tic).

Todavia, nem todo mundo tem um céu de brigadeiro.

She's not me
She doesn't have my name
She'll never have what I have
It won't be the same
(It won't be the same)

sábado, 3 de maio de 2008

Clichê número 56:

[Tom Wolfe, na imagem]

Essa pergunta é um puta clichê, até porque eu mesma não tenho uma resposta fechada pra isso, mas me diga o que te levou a fazer jornalismo.

"Um clichê do cacete mesmo (risos). Meu pai. Apesar de não ser jornalista, foi o meu pai que impulsionou isso. Ele era muito culto. Assim, hoje eu tenho cinco mil CD’s, ele tinha dois mil vinis (...) As reuniões da turma dele eram em casa, muita Bossa Nova, muita MPB setentista, ele escrevia poesia, lia, escrevia para jornal, foi radialista em rádio. Ele sonhava, ele queria ter feito jornalismo e nunca fez. E isso me fez, primeiro a gostar de música, que foi o 'start' inicial; e me fez ter vontade de ser jornalista. Foi uma coisa não pensada e lógico, esse foi o primeiro 'start' assim, aquela primeira coisa 'nossa, que legal', 'deve ser legal fazer isso', 'meu velho faz isso e tal'. E depois foi quando eu comecei e ler muito sobre música e lendo as pessoas que me ensinaram a gostar de textos e música."

Quem me respondeu foi o querido Marcelo Costa – editor de homes, jornalista (com alma de publicitário, e isso é muito bom), um-cara-que-escreve-tudo-que-a-Talita-gosta-de-ler, e o único que consegue misturar Calmantes com Champagne. Mister Costa é leonino com ascendente em touro e fã de caipirinha de vodka; aliás, se eu lembrasse dessa parte da caipirinha eu não teria convidado o Mac para uma entrevista na Bella Paulista, deveras. Mas como se tratava de uma terça-feira – típica da paulicéia desvairada, com ventos inevitáveis e um espectro de garoa –, e eu teria aula no outro dia, o jeito foi aproveitar a Bella e o seu adorável ambiente de sempre.

[Vivendo um TCC freneticamente]

domingo, 27 de abril de 2008

A Melhor.

Ela canta como se tivesse uma dor ou uma culpa muito grande - não consigo definir se é dor ou culpa, mas um dos dois deve ser. A voz rouca traz a melancolia exata, apesar da tênue linha de doçura [que me cativa]. Palavras soluçantes, embora deixem um conforto a cada pausa de respiração dela.

Once I wanted to be the greatest
No wind or waterfall could stall me
And then came the rush of the flood
Stars of night turned deep to dust

Mistura de uísque com chá de camomila. Em tom de soul, piano e sax, com o propósito de simular algum movimento da pélvis. A propósito, as pessoas têm a mania de balançar a cabeça ou deslocar o pé no compasso da música. Outras não. Deixam os pés em latência - por conta do quesito confortabilidade, apenas por isso. Minha cabeça continua imóvel, como se estivesse amarrada entre a altura da costela e o teto da sala. Consegue imaginar?

There's nothing like living in a bottle
And nothing like ending it all for the world
We're so glad you will come back
Every living lion will lay in your lap

[Ao som de MGMT, como se não houvesse o amanhã. O estranho é escrever sobre Cat Power com 'Eletric Feel' na cabeça].

segunda-feira, 21 de abril de 2008

16 doses de Tequila.

Metáfora
Meta fora
Fora meta

Metade
Fora
Fora
Dentro
Dentro
Fora

Metade dentro
Metade fora

Fora meta
Meta fora
Metáfora

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Com Açúcar, Com Afeto.

Ta-Hi, eu fiz tudo pra você gostar de mim
Oh meu bem não faz assim comigo não
Você tem, você tem é que me dar seu coração

Essa história de gostar de alguém
Já é mania que as pessoas tem
Se me ajudasse nosso senhor
Eu não pensaria só no amor
Se me ajudasse nosso senhor
Eu não pensaria só no amor

Fernanda Takai. Ode á Takai. A foto é do blog da própria, a amapaense escreve que é um primor, a propósito.

O tal 'Onde Brilhem Os Olhos Seus' é encantador - e acompanha essa que vos escreve desde a sua adorável saga [entre colchetes] respirando ares sulistas. Quanto ás canções, fica impossível parar na primeira faixa e pausar a voz da moça. Doce - tal qual no Pato Fu, com Erika Machado ou com Amarante - e cantarolando Nara, Vinícius, Tom, Chico (...)

Alguém me dá o livro da Fernanda agora, vai. 'Nunca Subestime Uma Mulherzinha' deve ser viciante idem.

domingo, 13 de abril de 2008

Entre heróis e estrelas.


Uma cabeça em forma de 'quebra-cabeça'. Espelhos assimétricos. Topete num cabelo vermelho blasé desfiado, e sem nenhum propósito em particular. Tapa-olho de pirata na pupila direita. Brinco de argola dourada, também de pirata. Lenço preto amarrado ao pescoço. Calça colada, detalhando a magreza dos gambitos e a elegância postural do cantor. Guitarra na altura da cintura, cujos timbres elétricos quase são sugados pela boca do estômago. Biquinho maroto pra câmera.

Enquanto suspira um 'Doo, doo, doo, doo, doo, doo, doo, doo', a guitarra na altura da cintura é silenciada momentaneamente para versos mais precisos:

You've got your mother in a whirl
She's not sure if you're a boy, or a girl
Hey, babe, your hair's alright
Hey, babe, let's go out tonight

'Rebel, rebel' pode ser vista apenas como uma canção secular do mito BowieMania. Ou, quem sabe, uma confissão fidedigna da bipolaridade material do ator, músico, pai, mãe, amante, roqueiro, David Robert Haywood-Jones; sim, David Bowie.

'Rebel, rebel' insinua e deixa Bowie a vontade. Montado em um modesto salto alto - que devia ter lá os seus quase 20 centímetros - soando como um andrógino dúbio, Ziggy Stardust ressalva que tem que ter muita rebeldia correndo nas veias para assumi-la. E, convenhamos que um salto daquele quilate já prova um mínimo disso, não é mesmo?

Rebel, rebel, you've torn your dress
Rebel, rebel, your face is a mess
Rebel, rebel, how could they know?
Hot tramp, I love you so

Visionário, moderno, premeditado. O homem não pôde prever o passado-presente de Bowie; nem que ele e Iggy Pop dividiriam o mesmo teto em Berlim ou que Mister Stardust serviria de inspiração para os (também) ingleses do Joy Division.

Palavras agostinianas escapam pelo teclado enquanto busco por alguma menção que diga 'You like me and I like it all'.

Don't 'ya?
Don't 'ya?

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Divina Comédia, parte II

Há um tempo não muito distante, eu costumava escrever coisas mais bonitas e fundamentadas. Não que ainda não as escreva ultimamente, ainda tenho devoção pelas palavras. Mas, a questão é que eu ando um tanto egoísta deveras com os meus textos nas últimas vinte e tantas horas. Sinto-me impulsionada a falar de um tema pertinente, que ás vezes conheço todos os detalhes, contudo, por ora, em alguns momentos eu desconheço estes detalhes sem parcialidade nenhuma.

Esse tema não me solta pela mão, fez pacto com a minha sombra, escuta as minhas conversas no celular e ainda quer segurar a minha toalha quando tomo banho. Esse tema quer apanhar o meu copo e beber dele, aproveitando enquanto seguro o isqueiro de um amigo. Esse tema quer um pouco de atendimento personalizado sete dias por semana, embora adore compartilhar a sua própria solidão consigo mesmo nos dias de Outono. Esse tema sonha pequeno quando pára de sonhar, e sonha grande quando começa a idealizar um pensamento desconhecido - o curioso continua sendo o elemento surpresa da vida desse tema. Esse tema escolhe os personagens da sua peça, porém não distribuiu roteiros nem falas prontas. 'Que os atores tenham a habilidade de se encontrarem no palco', disse no intuito que nenhum dos artistas escutasse e que, assim, dessem mais valia ao acaso.

Aliás, eu faria uma reportagem de dezessete páginas para a New Yorker com esse tema. Usaria fontes oficiais e oficiosas, fontes de segunda linha - que teriam os nomes devidamente protegidos -, e safados sem lei, que tivessem argumentos marginais, também seriam ouvidos. Passaria noites em claro com a luz dos postes da avenida sendo testemunha dos meus escritos. Sentaria na sacada, com o peito fechado e um coração saltitando para vibrar por motivos conhecidos.

Eu faria uma resenha alusiva e extremamente crítica sobre os últimos anos desse tema, e, principalmente, sobre tudo que ficou perdido. No entanto, eu também faria uma crônica à la Machado de Assis para enobrecer a beleza dos olhos desse tema. Não, a beleza dos olhos não, melhor: o jeito cativo que este tema tem ao observar as vogais de um mundo falido de consoantes ímpares; e discorreria a respeito da sua reza imprópria por mais disponibilidade acessível de vodka á um mundo que precisa beber para tornar este mundo mais interessante.

Egoísmo de lado e incitações de outro, o meu assunto preferido nos últimos minutos e tantos segundos sou eu: entre variantes, definições, medos, amores, convicções - porque existe sim, uma saliente diferença entre 'certeza' e 'convicção' - e outros delírios não menos tragáveis.

Para que o texto fique mais ou menos agradável, eu conto uma história enquanto busco um café (...)

Botinha sem freio num pé descalço imaginário do menino que segura os raios fumegantes de um dia de sol quente paulatinamente mais quente a cada vez que o menino percebe que um de seus pés está no asfalto queimando em brasa o calor ardido de quase trinta e oito graus na Rua Joaquim de Freitas no Alto da Boa Lapa. O menino procura pelo outro par da botinha cor alaranjada esqueci de mencionar logo não seria difícil encontrá-la no entanto certamente a premissa de procurar pelo calçado ficara esquecida quando o calor aumenta e começa a tostar a cabeça do menino. O sol fica deliberadamente ardido e faz o menino esquecer-se do outro par da botinha alaranjada que não fora achada nem tampouco seria. O menino passa a mão no seu pé e percebe que o asfalto agora faz parte do seu andar em outras palavras a botinha alaranjada era o arquétipo menos importante de fato o menino agora podia andar para onde quisesse pois ele era parte de uma estrada a sua estrada.

- Alguém precisa de vírgulas na vida?, pergunto.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

O tempo que nunca existiu.

A teoria do realismo, para a filosofia, preconiza que existe um tempo na mente humana que difere do tempo do espaço em que o dono desta mente está inserido, enquanto o idealismo acredita no antagônico: que o tempo é uma unidade que compreende as duas situações de tempo, o da mente humana e o espacial.

O idealista Kant acreditava que o espaço não pode ser analisado à parte o tempo. Para o filósofo alemão, a simples constatação de alguma coisa 'fora' já estabelece uma representação de espaço e de tempo. Afinal, existe uma tênue diferença em situarmos uma coisa que acontece 'fora' e uma coisa que acontece 'dentro’. Mesmo tendo interesses delimitados em estudar o tempo e o espaço com o intuito de ampliar os seus argumentos na metafísica, Kant também devotou-se em analisar o tempo de modo emocional (em partes). Do contrário, ele não teria investido anos em pesquisa, nem escrito profundamente sobre o assunto.

'Crítica da Razão Pura' foi o livro mais lido de Kant. Nestes escritos, o alemão aborda uma série de questões dogmáticas. Ao falar do tempo, Kant sintetiza que, ao seu ver, o tempo existe por conta de dois fatores: percepção e sensibilidade. Contudo, o escritor cita um elemento demasiadamente importante para que ambos tenham valia. Trata-se da razão.

Razão temporal que hoje nos falta muitas vezes. Razão esta que, intencionalmente, queremos que nos falte. Preferimos a situação comodista pelo conforto, pela praticidade, e porque é mais fácil ficar a mercê do pragmatismo, do acaso e do tempo. Ora, se a razão se faz inexistente, como utilizar os fundamentos de percepção e sensibilidade citados por Kant? Só nós damos conta da existência do tempo quando uma Lei da Física é jogada em nossos ombros.

Newton foi o pensador a constatar que toda ação gera uma reação. Nas palavras do próprio "Para cada ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade".

O maior pensador de todos os tempos, Einstein, vai por caminho similar quando afirma que a constância entre ação e reação no tempo compreende a seqüência de que um acontecimento é resultado de outro acontecimento.

Ao traçarmos um paralelo entre Newton e Einstein, e a noção que temos de tempo, chegararíamos ao raciocínio de que o tempo é objetivo; e já existia a muito antes de nós mesmos existirmos. Todavia, Kant nos trouxe a relevância subjetiva do tempo. Embora intocável, guardado nos ponteiros do relógio em segundos, minutos e horas, o tempo - imaterial - é o que nos dá fôlego em vivenciar experiências e nos sentirmos de alguma forma vivos, enquanto tivermos tempo.

A realidade racional mora na ciência física e, no final, se prende apenas em tabular números, já a razão emocional - aquela citada por Kant - nos traz a realidade emocional, de maneira a nos tornar criaturas livres no tempo que compreende o espaço e nos deixa aptos a percebê-lo e senti-lo.

Kant, embora grande pesquisador em assuntos metafísicos, se preocupou tanto em analisar a ação temporal e espacial do tempo que eu me sinto um bocado covarde em desperdiçar o meu tempo com banalidades irrelevantes.

Perder um tempo que talvez nunca vá existir é um pecado que eu não quero me dar a sensação de conhecer.


Divina Comédia, parte I

Já usei aparelho. Agora eu reparo no sorriso alheio.
Já fui indecisa. Agora eu divido os meus pontos de vista.
Já tive vergonha. Agora eu prefiro o despautério por conveniência.
Já pensei em fugir. Agora eu não me aprisiono.
Já sonhei em ser jornalista. Agora eu quero ser mais.
Já aceitei ser a namorada. Agora eu não quero nomeações.
Já quis conhecer a Xuxa. Agora quero o Dalai Lama.
Já gostei de Legião Urbana. Agora ouço The Raveonettes.
Já falei verdades sem pensar. Agora eu falo a minha verdade.
Já fui insegura. Agora eu começo a ter certezas.
Já pensei em alguém o dia todo. Agora eu penso por meses.
Já tive medo. Agora eu aproveito.

E tudo muda o tempo todo. Os anos vêm e as fases pedem licença, sem 'pedir' por nada, sem implorar espaço algum. Eu é que tento nivelar preferências, de acordo com o meu referencial.

sábado, 22 de março de 2008

Um deserto.

O dono da passagem do tempo é quem tem o controle de delimitar os minutos que cada um vai ter por toda a vida. Ele é responsável por trazer um riso ás nove da manhã, ou demonstrar uma lágrima aquecida no canto dos olhos ao entardecer.

O dono da passagem do tempo se esconde onde ninguém pode alcançá-lo, num deserto imenso coberto por uma distância visionariamente imaginária e uma linha acobreada e cercada de fios de navalha.

Sei deste tom de cobre e dos fios de navalha, pois já tive andança recente por esse deserto. Aliás, o dono da passagem já desconfia que estive por lá. E, certamente, ele não ia ficar muito contente em diagnosticar que alguém com paradoxos flutuantes colocou os pés por sobre a areia platinada do seu deserto particular. Mas é fato, o deserto existe e o dono da passagem do tempo bem conhece a valia de seu lugar.

Nessa andança, percebi que nem todo deserto possui o seu Oasis. Trata-se de uma balela convidativa para o emaranhado de dúvidas presentes nessa região. Areia, sim, há muita. Tal qual a quantidade de vento que traz a tona o que se esconde debaixo do tapete do deserto: tanto as mentiras, trapaças e investidas falhas; como também os bilhetes rasgados, os abraços esquecidos e os beijos não dados.

E mais, cada um devia ter o seu deserto e o seu tapete. Entretanto que o dono da passagem do tempo não saiba disso também. Se por algum segundo o dono da passagem do tempo ousar ver a sua supremacia questionada ou testada como falível, a sua ação contraditória pode ser promovida em milésimos. E não teríamos como fugir após o ato.


As tempestades mais violentas de toda a via láctea acontecem no deserto. O dono da passagem do tempo costuma achar graça quando vê as primeiras gotas de tormento caindo lentamente no solo. Ele sabe que a cada novo milímetro de chuva, dois novos milímetros vão surgir e assim por diante. Sem contar que as chuvas não são corriqueiras por ali. É a matemática do deserto.

A alma do dono da passagem do tempo vive em conflito com a alma do deserto. A alma do deserto é livre, irradia com o Sol e dorme nos braços da Lua. Enquanto a alma do dono da passagem do tempo não consegue nem acordar.

Por todo o tempo, o dono da passagem do tempo prometeu zelar pelo deserto para que ninguém pisasse em seu tapete e descobrisse o que há escondido entre tanta areia. Eu ousei colocar os meus pés e caminhar sobre o deserto sem saber de tais condições, não sabia nem que existia um tapete e um muito por debaixo dele. Contudo, o dono da passagem do tempo desconfia ter visto pegadas de uma nômade marcadas no chão nunca antes pisado.

A minha caminhada pelo deserto não cessou. Agora eu espero ser encontrada pelo dono da passagem do tempo.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Onze.

Disseram-me que as tatuagens denotam as virtudes de uma pessoa. Seja pelo desenho escolhido, seja pela ousadia do traço, pela dor de sentir dor - e gostar da dor -, ou seja por conta de uma história que foi razão propulsora para marcar a pele com tinta e agulha.

As pessoas carregam cicatrizes e dores. Algumas mostram o que sentem com tanta veracidade e desprendimento com o que se dói, que chega a ser irreal o manifesto em forma de 'doa com a intensidade que doer, mas doa'. Outras escondem os locais marcados, por covardia de literar emoções antigas e, por conseqüência, histórias de um passado nem sempre tão distante.

É na pele que se conhece o tato. Tato esse, que prolonga sensações e ameniza um afeto que seria tocável somente no subjetivo. Entre colchetes, considero que o tocar a pele e tatear o intangível em forma de corpo é engraçado, chega a causar-me um atípico riso quando constato tal pseudo-afirmação; embora isso não faça diferença, uma vez que se tornou metodologia certa nos meus encontros e desencontros.

Previsibilidades conhecidas, o fato é que existe uma relação de amor e ódio entre pele e tatuagem. Ambas poderiam andar em linha reta, uma atrás da outra se não fosse um detalhe: as duas mostram os pecados assumidos (ou não) por cada um. E pecado por pecado, é por intermédio dele que as pessoas denunciam suas qualidades e advertências.

Acredite, pode-se denunciar um bocado pela arte em forma de rascunhos tatuados na pele. Afinal signos são signos, e não há como hesitar o oposto. O mundo todo é uma vaga representação do que somos e de como somos. As nossas marcas, tatuagens, contos, e toda essa pluralidade do 'ser' é o que nos deixam na condição de únicos.

Schopenhauer explica:

"O mundo como representação, isto é, unicamente do ponto de vista de que o consideramos aqui, tem duas metades essenciais, necessárias e inseparáveis. Uma é o objeto; suas formas são o espaço e o tempo, donde a pluralidade. A outra metade é o sujeito; não se encontra colocada no tempo e no espaço, porque existe inteira e indivisa em todo ser que percebe: daí resulta que um só desses seres junto ao objeto completa o mundo como representação, tão perfeitamente quanto todos os milhões de seres semelhantes que existem: mas, também, se esse ser desaparece, o mundo como representação não mais existe".

Entre colchetes, cabe o comentário de que tato tem a ver com vontade. Aliás, vontade é o que faz o meu ego megalomaníaco gritar em letras garrafais.


Ressalva: no âmago da literatura que é delimitada por analisar a dualidade existente entre 'um ponto de vista e a vista de um ponto'.

Últimas palavras em negrito.

Não sou santa,
Não nasci pra fazer caridade.
Não sei me fazer de rogada,
Nem oferecer metades de um nada.
Ao meu ver, metade tem a ver com meio, vazio e incompletude,
Enquanto eu gosto do contrário - ousado -, sempre:
Tenho apreço pelo cheio que completa.

(...)

O meu copo está repleto de inspiração.
Me embriagar é conseqüência.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Entre tangos e adoráveis tragédias.



Meu jardim
Meu reflexo
Meu afeto
Meu colorido
Meu beijo na orelha
Meu contador de histórias
Meu dormir abraçado
Meu acordar sem lençol
Meu pensador
Meu bonito
Meu marginal
Meu violão
Minha consoante
Minha gratidão
Meu continente
Meu revolucionário
Meu verbo literal
Meu confete de chocolate branco
Meu sonhar
Meu querido
Meu menino
Meu.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

À italiana.

Só teria alguma graça em sentir o carnaval, se Chico B. cantasse as suas modinhas carnavalescas. Imaginem-no descendo a Rua Augusta com os versos 'Estava à toa na vida, o meu amor me chamou, pra ver a banda passar cantando coisas de amor'. Melhor se Tom Z. viesse do lado, na Consolação, com a nota 'Lua uva. Lua nova, lua noiva, ô, luar.' Ia ser um festão daqueles, de deixar o peito em chamas.

Entretanto, a realidade subversiva vai pelo oposto. Em suma, temos escolas de samba superfaturadas em guetos, peitos siliconados - seja de rapariga ou de guri -, e nádegas (aos montes) no sacolejo de lá e de acolá.

Mas, viva a Brasiléia! Viva a bêra desigual no copo alheio, caro. Porque enquanto houver silicone e purpurina na avenida, assim será. No Rio de Janeiro ou na São Paulo de cá.

Não. Coração. Aqui, não há comentário que diga não gostar da festa tropicália. O feriado mais prolongado do país é bem-vindo, uma vez que deixa vago os dias para pensamentos saudosos. A propósito, alertaram-me que matar saudades é crime passional - nem que seja ao escrever notoriamente sem sentido o que nem a escritora deste faz questão de entender. Digamos que estou á beira do cárcere, e sem rendição alguma.

Viva a máfia, viva os contos romanos e as garrafas mexicanas!

'Eu tô te explicando
Prá te confundir
Eu tô te confundindo
Prá te esclarecer'

+++

Ressalva da Tapioca: quem vai fiscalizar as gastanças dos Ministérios Tupiniquins em pleno carnaval, que se manifeste. Cartão corporativo pode ser um perigo em festejos do corpo e da cachaça.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

de la Mancha.

(...) como quem dança a inabalável dança da irrealidade, me atiro nos braços do cavaleiro vermelho para ver até onde ele pode me levar.

"Havia em Sevilha um doido, que deu no mais gracioso disparate e teima que nunca se viu. E foi que fez um canudo de cana pontiagudo, e, em apanhando um cão na rua, ou em qualquer outra parte, prendia-lhe uma pata com os pés, com a mão levantava-lhe outra, e, como podia, lá lhe adaptava o canudo em sítio, em que, soprando-lhe, o punha redondo como uma péla, e, quando o apanhava deste modo, dava-lhe duas palmaditas na barriga, e soltava-o, dizendo aos circunstantes (que sempre eram muitos): Pensarão agora Vossas Mercês que é pouco trabalho inchar assim um cão. Pensará Vossa Mercê agora que é pouco trabalho fazer um livro." - M.C.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Aprenda a resolver um problema.

A melhor forma de solucionar um problema é arranjando mais problema.

Bacana, hum? Até parece fácil.

Não coloco essa afirmação entre aspas, pois entrego que ela é fruto da mente desta que vos escreve. E nem é mais novidade a minha preferência por uma conversa [entre colchetes]. No entanto, com fundamentação ou não, compartilho este protótipo de idéia de solução para os problemas. Para isso, acredito consideravelmente em um quesito que denomino por: imunidade renovável.

A minha teoria concentra-se no fato de que quando alguém chega ao status de ter um problema, esse alguém acha que tem o maior problema do mundo e que nunca vai conseguir se ver livre deste. Entretanto, ao término do calvário, o indivíduo se vê fortemente capaz perante aquele problema antigo e pronto para outro problema, assim que tiver um novo. É igual a uma gripe, resfriado, coisa e tal. O corpo dói, a cabeça fica fraca, você se enche de remédios, cogita entregar os pontos e cair de cama; mas no fim, aquela quantidade de antiinflamatórios e congêneres faz efeito e, tão cedo, o teu corpo vai estar viável para uma gripe novamente. Tudo vai depender do seu sistema imunológico. Taí: sistema imunológico, a tal da imunidade renovável.

Esse é o mecanismo para resolver problemas - se é que tem um mecanismo. Deve-se focar toda atenção ao fator que antecede o antes e o durante de um problema. Aquela velha história de que as coisas podem piorar, ponta do iceberg e Lei de Murphy podem ou não fazer sentido nesse aspecto. Tudo vai depender do seu posicionamento e das atitudes que revela.

Semiótica, comunicação e rock'n'roll

Falar de problema sem falar de semiótica seria o mesmo que falar de Rock sem falar de Elvis, ou falar dos anos 80 sem um comentário sobre a Madonna. É certo que nenhuma criatura humana é obrigada a denotar a relevância do estudo semiótico. Contudo, para os comunicólogos de plantão, semiótica é vida.

O conceito desta arte envolve o estudo criterioso - e comunicacional - dos signos (ou sistemas de significação) de todas as manifestações culturais e de todos os fenômenos do homem, como se ambos fossem simples estruturas sígnicas. Quase-bastante complicado, eu diria. Tanto que, na primeira vez que ouvi a minha professora de Teoria da Comunicação, Lia Maria Leal, detalhar essa significação toda eu pirei. Todavia, achei tudo muito lindo.

Pois bem. Em outras palavras, a semiótica procura o entendimento do homem, da vida do homem, e da realidade em que o homem está inserido. Digamos que ela é capaz de visualizar a realidade global deste homem quando ele mesmo não detém a capacidade - entenda-se por isso: racionalidade - de perceber certos acontecimentos. Plagiando o lado universitário, a semiótica consegue verificar um problema, a razão deste problema, e promulgar uma solução cabível.

Num contexto geral, é mais ou menos isso.

Ok. Eu adoraria falar de semiótica, porém o enfoque agora é outro. Um problema, na comunicação, é um algo que questiona uma dúvida e que pede a resolução dessa dúvida - a favor ou contra o que foi determinado.

Sem o lado negativo e imposto pela sociedade de que problema é um abstrato sem solução, vejamos o contrário. Problema é aquilo que nos traz uma verdade que foge aos olhos por comodismo. Quando essa verdade é devidamente escancarada, ela mostra as nossas fragilidades. E ser vítima é mais fácil do que dar a cara para bater e saber onde dói - não á toa, as novelas vangloriam heróis e mocinhas. Enquanto o melhor mesmo, é ser vilão da nossa própria história.

Por isso, acho plausível admitir os erros, os acertos e não ter medo dos problemas ou medo de solucioná-los. Problema é aquilo que nos faz refletir e perder o receio da queda. Afinal, sempre corremos o risco de tropeçar em algo mais interessante durante a queda. E, ai, quem vai te levantar e te fazer correr atrás de outros problemas em tom de desafio? Você, e mais ninguém.

+++

PS: isso não é um texto de auto-ajuda.