Mania de sonhar o inexplicável.
Olhando para trás, percebo que fizeram muito por mim. Confesso não ser a sociabilidade em forma de gente, no entanto, conheci pessoas que me deixaram provar do inverso. Quando digo isso, lembro dos sorrisos que me foram entregues com facilidade; dos amigos antigos, sempre presentes embora a ausência física seja amarga; dos novos amigos, que já parecem conhecidos de longa data; de brindar com razão; de brindar por duas décadas; de fazer a linha 'Brilho Eterno de Uma Talita Sem Lembranças'; de trilhas sonoras impecáveis; de decorar os discos da Feist sem querer; da telepatia habitual; dos meus pecados sulistas; das ligações não atendidas; das minhas vontades feitas; do gosto pelo café; do gosto pelo alheio; da devoção por cinema; da sensação de liberdade, mesmo namorando despretensiosamente.
Por conta disso, descobri que o meu coração é um bocado grande. Se eu comentar algo relativo com o meu primo, é certo que ele vai fazer uma piada sem graça referente ao número do meu sutiã. Contudo, falo sério. Acredito que a causa da minha morte - que um dia virá - vai ser por motivos cardíacos. Não por questões de sofrimento passional; pelo contrário, o lado esquerdo do peito está tranqüilo e cada vez mais enamorado. Porém, apesar de ter um coração forte sem muitas decepções para contar, o músculo involuntário dói. E sempre pelo mesmo motivo. Saudade é o que há.
Não tenho dúvida de que pessoas legais moram longe. Entretanto pessoas mais-que-legais, daquelas que tu vai querer contigo nem que seja em pensamento, moram muito mais longe ainda. De fato, eu nasci pra sentir isso. Sou um poço de nostalgia e uma saudade ambulante. Sinceramente, isso não muda; uma vez que não há remédio que reverta o irreversível. Quanto à inexistência de cura para ações imutáveis, aquela mania de se apaixonar continua. Vi-me encantada desmedidamente três vezes, por almas tão iguais e tão diferentes entre si. A propósito, disseram-me que nos apaixonamos por pessoas que carregam consigo um pouco do que temos e um muito do que queríamos ter.
Não é que isso tem uma lógica?
Pois bem, comprovando que eu não meço limites e deslimites em tangência do que eu sinto - e, quando eu sinto, eu sinto em demasia -, não tive vergonha de aparecer sem aviso, nem tive receio de pedir cafuné; não tive medo de tirar o vestido ou confessar a proporção dos meus sentimentos; peguei no sono da melhor forma do mundo em 22 de setembro; e aprendi um mínimo de italiano e espanhol, meio que para falar na mesma língua que os amados.
O vício por sotaque é aquela coisa toda. O vício por consoantes, idem.
Ganhei presentes sem aviso prévio. Até consigo escolher o mais adorado com unanimidade: foi quando o guri de camisa xadrez cantou Mutantes e disse que a minha Keep Cooler de pêssego era frescura de menininha, embora assumir que achava um charme.
Ganhei um sobrinho.
Mudei um tanto. Todavia, ainda tenho as minhas teorias loucas, planos que beiram o mirabolante e atitudes sem sentido. Ainda omito frases e me calo no silêncio do desdizer quando acho necessário. Ainda sou indecisa. Ainda tenho as minhas convicções e argumentos próprios. Ainda vejo beleza no teu provérbio e na tua perna direita, naquela foto da lambreta. Ainda faço promessas só pra ver o teu riso de canto e a tua face de curiosidade. Ainda escrevo os meus delírios. Ainda falo bobagem e danço olhando para o nada. Ainda continuo na saga de não planejar, e isso também não muda.
Dois mil e oito, continuará deliciosamente assim.