domingo, 27 de abril de 2008

A Melhor.

Ela canta como se tivesse uma dor ou uma culpa muito grande - não consigo definir se é dor ou culpa, mas um dos dois deve ser. A voz rouca traz a melancolia exata, apesar da tênue linha de doçura [que me cativa]. Palavras soluçantes, embora deixem um conforto a cada pausa de respiração dela.

Once I wanted to be the greatest
No wind or waterfall could stall me
And then came the rush of the flood
Stars of night turned deep to dust

Mistura de uísque com chá de camomila. Em tom de soul, piano e sax, com o propósito de simular algum movimento da pélvis. A propósito, as pessoas têm a mania de balançar a cabeça ou deslocar o pé no compasso da música. Outras não. Deixam os pés em latência - por conta do quesito confortabilidade, apenas por isso. Minha cabeça continua imóvel, como se estivesse amarrada entre a altura da costela e o teto da sala. Consegue imaginar?

There's nothing like living in a bottle
And nothing like ending it all for the world
We're so glad you will come back
Every living lion will lay in your lap

[Ao som de MGMT, como se não houvesse o amanhã. O estranho é escrever sobre Cat Power com 'Eletric Feel' na cabeça].

segunda-feira, 21 de abril de 2008

16 doses de Tequila.

Metáfora
Meta fora
Fora meta

Metade
Fora
Fora
Dentro
Dentro
Fora

Metade dentro
Metade fora

Fora meta
Meta fora
Metáfora

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Com Açúcar, Com Afeto.

Ta-Hi, eu fiz tudo pra você gostar de mim
Oh meu bem não faz assim comigo não
Você tem, você tem é que me dar seu coração

Essa história de gostar de alguém
Já é mania que as pessoas tem
Se me ajudasse nosso senhor
Eu não pensaria só no amor
Se me ajudasse nosso senhor
Eu não pensaria só no amor

Fernanda Takai. Ode á Takai. A foto é do blog da própria, a amapaense escreve que é um primor, a propósito.

O tal 'Onde Brilhem Os Olhos Seus' é encantador - e acompanha essa que vos escreve desde a sua adorável saga [entre colchetes] respirando ares sulistas. Quanto ás canções, fica impossível parar na primeira faixa e pausar a voz da moça. Doce - tal qual no Pato Fu, com Erika Machado ou com Amarante - e cantarolando Nara, Vinícius, Tom, Chico (...)

Alguém me dá o livro da Fernanda agora, vai. 'Nunca Subestime Uma Mulherzinha' deve ser viciante idem.

domingo, 13 de abril de 2008

Entre heróis e estrelas.


Uma cabeça em forma de 'quebra-cabeça'. Espelhos assimétricos. Topete num cabelo vermelho blasé desfiado, e sem nenhum propósito em particular. Tapa-olho de pirata na pupila direita. Brinco de argola dourada, também de pirata. Lenço preto amarrado ao pescoço. Calça colada, detalhando a magreza dos gambitos e a elegância postural do cantor. Guitarra na altura da cintura, cujos timbres elétricos quase são sugados pela boca do estômago. Biquinho maroto pra câmera.

Enquanto suspira um 'Doo, doo, doo, doo, doo, doo, doo, doo', a guitarra na altura da cintura é silenciada momentaneamente para versos mais precisos:

You've got your mother in a whirl
She's not sure if you're a boy, or a girl
Hey, babe, your hair's alright
Hey, babe, let's go out tonight

'Rebel, rebel' pode ser vista apenas como uma canção secular do mito BowieMania. Ou, quem sabe, uma confissão fidedigna da bipolaridade material do ator, músico, pai, mãe, amante, roqueiro, David Robert Haywood-Jones; sim, David Bowie.

'Rebel, rebel' insinua e deixa Bowie a vontade. Montado em um modesto salto alto - que devia ter lá os seus quase 20 centímetros - soando como um andrógino dúbio, Ziggy Stardust ressalva que tem que ter muita rebeldia correndo nas veias para assumi-la. E, convenhamos que um salto daquele quilate já prova um mínimo disso, não é mesmo?

Rebel, rebel, you've torn your dress
Rebel, rebel, your face is a mess
Rebel, rebel, how could they know?
Hot tramp, I love you so

Visionário, moderno, premeditado. O homem não pôde prever o passado-presente de Bowie; nem que ele e Iggy Pop dividiriam o mesmo teto em Berlim ou que Mister Stardust serviria de inspiração para os (também) ingleses do Joy Division.

Palavras agostinianas escapam pelo teclado enquanto busco por alguma menção que diga 'You like me and I like it all'.

Don't 'ya?
Don't 'ya?

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Divina Comédia, parte II

Há um tempo não muito distante, eu costumava escrever coisas mais bonitas e fundamentadas. Não que ainda não as escreva ultimamente, ainda tenho devoção pelas palavras. Mas, a questão é que eu ando um tanto egoísta deveras com os meus textos nas últimas vinte e tantas horas. Sinto-me impulsionada a falar de um tema pertinente, que ás vezes conheço todos os detalhes, contudo, por ora, em alguns momentos eu desconheço estes detalhes sem parcialidade nenhuma.

Esse tema não me solta pela mão, fez pacto com a minha sombra, escuta as minhas conversas no celular e ainda quer segurar a minha toalha quando tomo banho. Esse tema quer apanhar o meu copo e beber dele, aproveitando enquanto seguro o isqueiro de um amigo. Esse tema quer um pouco de atendimento personalizado sete dias por semana, embora adore compartilhar a sua própria solidão consigo mesmo nos dias de Outono. Esse tema sonha pequeno quando pára de sonhar, e sonha grande quando começa a idealizar um pensamento desconhecido - o curioso continua sendo o elemento surpresa da vida desse tema. Esse tema escolhe os personagens da sua peça, porém não distribuiu roteiros nem falas prontas. 'Que os atores tenham a habilidade de se encontrarem no palco', disse no intuito que nenhum dos artistas escutasse e que, assim, dessem mais valia ao acaso.

Aliás, eu faria uma reportagem de dezessete páginas para a New Yorker com esse tema. Usaria fontes oficiais e oficiosas, fontes de segunda linha - que teriam os nomes devidamente protegidos -, e safados sem lei, que tivessem argumentos marginais, também seriam ouvidos. Passaria noites em claro com a luz dos postes da avenida sendo testemunha dos meus escritos. Sentaria na sacada, com o peito fechado e um coração saltitando para vibrar por motivos conhecidos.

Eu faria uma resenha alusiva e extremamente crítica sobre os últimos anos desse tema, e, principalmente, sobre tudo que ficou perdido. No entanto, eu também faria uma crônica à la Machado de Assis para enobrecer a beleza dos olhos desse tema. Não, a beleza dos olhos não, melhor: o jeito cativo que este tema tem ao observar as vogais de um mundo falido de consoantes ímpares; e discorreria a respeito da sua reza imprópria por mais disponibilidade acessível de vodka á um mundo que precisa beber para tornar este mundo mais interessante.

Egoísmo de lado e incitações de outro, o meu assunto preferido nos últimos minutos e tantos segundos sou eu: entre variantes, definições, medos, amores, convicções - porque existe sim, uma saliente diferença entre 'certeza' e 'convicção' - e outros delírios não menos tragáveis.

Para que o texto fique mais ou menos agradável, eu conto uma história enquanto busco um café (...)

Botinha sem freio num pé descalço imaginário do menino que segura os raios fumegantes de um dia de sol quente paulatinamente mais quente a cada vez que o menino percebe que um de seus pés está no asfalto queimando em brasa o calor ardido de quase trinta e oito graus na Rua Joaquim de Freitas no Alto da Boa Lapa. O menino procura pelo outro par da botinha cor alaranjada esqueci de mencionar logo não seria difícil encontrá-la no entanto certamente a premissa de procurar pelo calçado ficara esquecida quando o calor aumenta e começa a tostar a cabeça do menino. O sol fica deliberadamente ardido e faz o menino esquecer-se do outro par da botinha alaranjada que não fora achada nem tampouco seria. O menino passa a mão no seu pé e percebe que o asfalto agora faz parte do seu andar em outras palavras a botinha alaranjada era o arquétipo menos importante de fato o menino agora podia andar para onde quisesse pois ele era parte de uma estrada a sua estrada.

- Alguém precisa de vírgulas na vida?, pergunto.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

O tempo que nunca existiu.

A teoria do realismo, para a filosofia, preconiza que existe um tempo na mente humana que difere do tempo do espaço em que o dono desta mente está inserido, enquanto o idealismo acredita no antagônico: que o tempo é uma unidade que compreende as duas situações de tempo, o da mente humana e o espacial.

O idealista Kant acreditava que o espaço não pode ser analisado à parte o tempo. Para o filósofo alemão, a simples constatação de alguma coisa 'fora' já estabelece uma representação de espaço e de tempo. Afinal, existe uma tênue diferença em situarmos uma coisa que acontece 'fora' e uma coisa que acontece 'dentro’. Mesmo tendo interesses delimitados em estudar o tempo e o espaço com o intuito de ampliar os seus argumentos na metafísica, Kant também devotou-se em analisar o tempo de modo emocional (em partes). Do contrário, ele não teria investido anos em pesquisa, nem escrito profundamente sobre o assunto.

'Crítica da Razão Pura' foi o livro mais lido de Kant. Nestes escritos, o alemão aborda uma série de questões dogmáticas. Ao falar do tempo, Kant sintetiza que, ao seu ver, o tempo existe por conta de dois fatores: percepção e sensibilidade. Contudo, o escritor cita um elemento demasiadamente importante para que ambos tenham valia. Trata-se da razão.

Razão temporal que hoje nos falta muitas vezes. Razão esta que, intencionalmente, queremos que nos falte. Preferimos a situação comodista pelo conforto, pela praticidade, e porque é mais fácil ficar a mercê do pragmatismo, do acaso e do tempo. Ora, se a razão se faz inexistente, como utilizar os fundamentos de percepção e sensibilidade citados por Kant? Só nós damos conta da existência do tempo quando uma Lei da Física é jogada em nossos ombros.

Newton foi o pensador a constatar que toda ação gera uma reação. Nas palavras do próprio "Para cada ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade".

O maior pensador de todos os tempos, Einstein, vai por caminho similar quando afirma que a constância entre ação e reação no tempo compreende a seqüência de que um acontecimento é resultado de outro acontecimento.

Ao traçarmos um paralelo entre Newton e Einstein, e a noção que temos de tempo, chegararíamos ao raciocínio de que o tempo é objetivo; e já existia a muito antes de nós mesmos existirmos. Todavia, Kant nos trouxe a relevância subjetiva do tempo. Embora intocável, guardado nos ponteiros do relógio em segundos, minutos e horas, o tempo - imaterial - é o que nos dá fôlego em vivenciar experiências e nos sentirmos de alguma forma vivos, enquanto tivermos tempo.

A realidade racional mora na ciência física e, no final, se prende apenas em tabular números, já a razão emocional - aquela citada por Kant - nos traz a realidade emocional, de maneira a nos tornar criaturas livres no tempo que compreende o espaço e nos deixa aptos a percebê-lo e senti-lo.

Kant, embora grande pesquisador em assuntos metafísicos, se preocupou tanto em analisar a ação temporal e espacial do tempo que eu me sinto um bocado covarde em desperdiçar o meu tempo com banalidades irrelevantes.

Perder um tempo que talvez nunca vá existir é um pecado que eu não quero me dar a sensação de conhecer.


Divina Comédia, parte I

Já usei aparelho. Agora eu reparo no sorriso alheio.
Já fui indecisa. Agora eu divido os meus pontos de vista.
Já tive vergonha. Agora eu prefiro o despautério por conveniência.
Já pensei em fugir. Agora eu não me aprisiono.
Já sonhei em ser jornalista. Agora eu quero ser mais.
Já aceitei ser a namorada. Agora eu não quero nomeações.
Já quis conhecer a Xuxa. Agora quero o Dalai Lama.
Já gostei de Legião Urbana. Agora ouço The Raveonettes.
Já falei verdades sem pensar. Agora eu falo a minha verdade.
Já fui insegura. Agora eu começo a ter certezas.
Já pensei em alguém o dia todo. Agora eu penso por meses.
Já tive medo. Agora eu aproveito.

E tudo muda o tempo todo. Os anos vêm e as fases pedem licença, sem 'pedir' por nada, sem implorar espaço algum. Eu é que tento nivelar preferências, de acordo com o meu referencial.