Uma cabeça em forma de 'quebra-cabeça'. Espelhos assimétricos. Topete num cabelo vermelho blasé desfiado, e sem nenhum propósito em particular. Tapa-olho de pirata na pupila direita. Brinco de argola dourada, também de pirata. Lenço preto amarrado ao pescoço. Calça colada, detalhando a magreza dos gambitos e a elegância postural do cantor. Guitarra na altura da cintura, cujos timbres elétricos quase são sugados pela boca do estômago. Biquinho maroto pra câmera.
Enquanto suspira um 'Doo, doo, doo, doo, doo, doo, doo, doo', a guitarra na altura da cintura é silenciada momentaneamente para versos mais precisos:
You've got your mother in a whirl
She's not sure if you're a boy, or a girl
Hey, babe, your hair's alright
Hey, babe, let's go out tonight
'Rebel, rebel' pode ser vista apenas como uma canção secular do mito BowieMania. Ou, quem sabe, uma confissão fidedigna da bipolaridade material do ator, músico, pai, mãe, amante, roqueiro, David Robert Haywood-Jones; sim, David Bowie.
'Rebel, rebel' insinua e deixa Bowie a vontade. Montado em um modesto salto alto - que devia ter lá os seus quase 20 centímetros - soando como um andrógino dúbio, Ziggy Stardust ressalva que tem que ter muita rebeldia correndo nas veias para assumi-la. E, convenhamos que um salto daquele quilate já prova um mínimo disso, não é mesmo?
Rebel, rebel, you've torn your dress
Rebel, rebel, your face is a mess
Rebel, rebel, how could they know?
Hot tramp, I love you so
Visionário, moderno, premeditado. O homem não pôde prever o passado-presente de Bowie; nem que ele e Iggy Pop dividiriam o mesmo teto em Berlim ou que Mister Stardust serviria de inspiração para os (também) ingleses do Joy Division.
Palavras agostinianas escapam pelo teclado enquanto busco por alguma menção que diga 'You like me and I like it all'.
Don't 'ya?
Don't 'ya?